sábado, agosto 02, 2008

arranjo e orquestração (parte 2)

"Quando João Gilberto se acompanha, o violão é ele. Quando a orquestra o acompanha, a orquestra também é ele" - Antonio Carlos Jobim, 1959.

O belo tipo faceiro que tenho ao meu lado chama-se Johnny Mandel, genial arranjador/ orquestrador/ autor de algumas célebres trilhas sonoras de Hollywood/ compositor de grandes canções do Grande Songbook Norte-Americano, como 'Emily', 'The Shadow of Your Smile' e muitas outras. Esta foto foi feita durante uma visita que fiz `a casa onde ele mora com a mulher em Malibu, California, há uns 4 anos atrás. O tempo voa... Nessa ocasião, tínhamos um projeto em mente, que, por muito caro, não conseguimos realizar. Ficou na vontade.

Ao invés desse projeto, acabei fazendo outro logo em seguida, com meu velho amigo Dori Caymmi, arranjador/ orquestrador/ compositor igualmente de altíssimo quilate, e ainda por cima, cantor e violonista brilhante. Foi um excelente negócio, musicalmente falando, e até hoje os ecos deste trabalho ainda rolam _ volta e meia nos apresentamos juntos, pelo simples prazer que a música nos dá.

Por que falo tanto nesses dois, Johnny e Dori? Porque são arranjadores e orquestradores geniais, mundialmente respeitados, e que igualmente me respeitam como músico que sou. Músico: palavra sem feminino.

Acontece que o fato de eu ser uma cantora (canária, na visão preconceituosa de alguns atrasados, em pleno século 21) me desabilitaria para as funções de arranjadora, que exerço normalmente em todos os meus discos desde 1980. Não me formei na Berklee, não sei dizer exatamente a extensão de cada instrumento de uma orquestra _ e no entanto sei exatamente o que vai e o que não vai soar nos discos que faço. Sei qual será a melhor opção para um instrumento solista e distribuo as vozes dos sopros que irão se misturar com a minha própria voz, num só naipe. Posso criar uma introdução e um desenho rítmico que irá modificar a estrutura de alguma música já por demais batida, caso eu tenha a intenção de regravá-la (fiz isso, por exemplo, na minha gravação de 'Upa Neguinho', em 1998, num arranjo do qual até o autor gostou (Edu é famoso por não gostar de quase nada), ou de 'Sambou, Sambou', que Donato adorou e passou a usar também, sempre que vem tocar comigo). Posso também dar minha contribuição `a harmonia da canção em questão, mesmo que seja só um acorde a mais, que não interfira na estrutura harmônica, mas faça uma graça para o autor. Tenho feito isso a vida toda, e é por isso que não me sinto canária, embora cantar seja o meu maior prazer. Mas a voz é um instrumento, como o violão também é, para melhor expressar uma idéia musical que me venha, seja essa música minha ou não.

E ainda assim, já me aconteceu de um orquestrador, com quem trabalhei diversas vezes ao longo dos anos (não importa quem), utilizar alguns arranjos meus em trabalhos de orquestração dele, sem o devido crédito _ e pelo contrário, assinando o arranjo como se fosse seu, inclusive para trabalhos com outros artistas. Coisa muito feia, que os grandes bambas ali de cima jamais fariam. Como gosto de ter fé na humanidade, quero crer que sendo eu, na opinião deste colega, uma simples canária, ele sinceramente acredita que os arranjos são dele...

"Eu trabalho assim: eu vou aonde você não estiver. Meu trabalho é preencher e colorir os espaços que você deixa na música" (Johnny Mandel, explicando para mim seu método como arranjador)

7 Comments:

At 10:53 AM, Anonymous Anônimo said...

Joyce.
Faz tempo. Mas eu e Danilo (Caymmi) conversávamos sobre arranjadores.Ele era fã de carteirinha do Ogerman. Eu, do Mandel. Ele babava ao falar do arranjo do alemão para Estate (Martino)em Amoroso do João Gilberto. Em tom de desafio, fiz uma cópia, (na época K7), para a mesma Estate, mas com Shirley Horn e arranjo do Mandel. Isso porque Danilo duvidava que alguém pudesse fazer melhor do que o Ogerman. Semanas depois ele me ligou, reconhecendo que o arranjo de Mandel era bem mais criativo. Chegou até a mostrar pro Dori. De fato, há uma grande diferença entre arranjador e orquestrador. Pena que o seu trabalho com o Mandel não rolou. Mas ainda há tempo. Mandel vai completar 83 anos mas está em pleníssima forma. Os gênios são assim.

 
At 10:58 AM, Anonymous Anônimo said...

By the way.
Peço permissão para colocar no nosso blog de jazz (www.cjub.com.br) esses dois últimos posts que vc fêz sobre arranjos e orquestrações. Na íntegra. Aguardando autorização. Abração.

 
At 1:22 AM, Blogger Luiz Antonio said...

Aqui não tenho que dar pitaco!Não enetendo nada disso, apenas sei do prazer de ouvir e sentir o que é belo, pensando bem isso já é saber alguma coisa! Mas, comento porque num post de ano atrás anunciavas a ida para uma temporada no exterior e eu, no post, te chamei de "canária". Agora fico sabendo que no meio isso parece ser "pejorativo". Não sabia e nem foi a intenção, referia-me a música Canario do Brasil. Pelo jeito deve ser algo como chamar Arquiteto de decorador, agora no meu chão, na minha profissão, é o fim. Registre-se.

 
At 5:29 PM, Anonymous Anônimo said...

é uma pena que os canários tenham se transformado em algo pejorativo quando se refere aos cantores.
comparar um animal que canta pela própria natureza com um ser humano que o faz por arte e inspiração devia ser elogio.

 
At 12:52 PM, Blogger Luiz Antonio said...

CHEGAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!!!!!!
o post a seguir não tem nada com o assunto Dinamarca, mas como sei que muita gente acessa aqui, vai meu desabafo:
Tem uma história, não sei se ficção ou não, sobre um gato de estimação do Joao Gilberto que teria se suicidado, depois de uma semana trancado no apartamento ouvindo o Joao tocar a mesma música. Pois bem, estou saturado de
tantos cantores e cantoras novos que surgem aos borbotões toda semana que levam como estandarte músicas da bossa nova, como se isso os lançasse a condição de vozes respeitadas da música brasileira porque foram garimpar a boa música ao invés de se lançarem como hits efêmeros. Não aguento mais ouvir versões de O Barquinho, Garota de Ipanema, Corcovado, Samba Meu, Desafinado, Influência do Jazz.... PÔ! Não vão se dar conta de que de lindas vozes e de lindas canções o Brasil tá cheio? Quero algo diferente! Quero gente cantando e fazendo Coisas Novas e não somente Bossa Nova. E quem acaba pagando o pato no final é mesmo a Bossa, de tanto ser gravada PRATICAMENTE SEM NENHUMA NOVIDADE HÁ QUASE 50 ANOS. Realmente pode ser caso de suicídio (a diferença é que ao inves de me jogar, eu, pela janela, como o gato do João, eu jogo meu IPod )
Musica criativa brasileira, arranjadores, orquestradores e canários salvem-nos!!! Vamos seguir na evolução músical da Bossa e não estacionar nela como unico bem músical brasileiro! Daqui a pouco até o Japão vai encher o saco disso. Nem só de vikings vive a Dinamarca!

 
At 11:35 AM, Anonymous Anônimo said...

Luis Antonio, após seu comentário sobre "coisas novas",queria te sugerir o site www.myspace.com/jazznbossaduo
www.myspace.com/marciohallack
depois se vc quiser me mande um email do que vc achou mhallack@terra.com.br
Penso tbem parecido com vc,mas como sou o pianista prefiro ficar quieto.
Abração.

 
At 12:39 AM, Blogger Luiz Antonio said...

Marcio, obrigado pelas dicas, vou acessar e te conto depois. Acho que o fato de eu ser apenas um brasileiro que gosta de música, sem conhecimento técnico, me deixa a vontade para falar essas coisas _devo dar cada desafinada, aqui,risos..._
Sou exagerado,um tanto dramático! Tem coisa boa cantando a velha bossa.Não posso deixar de falar, não de novidades, da bossanovista Rosa Passos. Essa nem quando canta a mesma "velha" música duas vezes consegue ser enfadonha, tem uma voz deliciosa e os músicos, os arranjos que acompanham também são sofisticados, elegantes, e acho que sobretudo AREJADOS. Ela conseguiu gravar Caýmmi (de novo!) e também Ary Barroso (de novo!) e algumas interpretações e arranjos são tão incríveis que pareciam músicas novas! O que ela faz com SÓ LOUCO, que só mesmo um louco conseguiria continuar ouvindo tantos séculos a fio, nossa! Quase ineditou a música!
Abraços

 

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