segunda-feira, agosto 04, 2014

o tenebroso inverno das idéias


Tenho pouco mais de um ano de experiência no Facebook. Mas já me sinto esgotada com tantos sentimentos escuros sendo expressados por pessoas que até então pareciam ser gente boa. E olha que meu círculo de amizades ali é mínimo, por escolha própria... E pelo visto, vai ficar menor ainda. Só nos últimos dias, tenho visto: antissemitismo x antiarabismo (em escala mundial); o fla x flu político do partidarismo no Brasil; racismo, preconceito, raiva, inveja (sim, inveja, inveja feia, inveja muita!), rancor, culminando agora com o apedrejamento moral de pessoas da melhor qualidade. Cito a frase de Caetano (que li n'O Globo de ontem): "a agressividade covarde que se pode ver na internet é um retrato da abjeção humana". Eu, hein. Me incluam fora disso.

Postei este texto no FB também, e recebi dezenas de respostas de amigos, pessoas que prezo muito e que sentem o mesmo incômodo que eu com a agressividade latente que se espalha nas redes. Há poucos dias saiu uma entrevista de Monica Salmaso onde ela fala de seu novo CD, dedicado à obra de Guinga e Paulo César Pinheiro. Obra que ela pesquisou durante toda uma década, até em velhas fitas cassete, pois a maioria era inédita, os parceiros brigaram e não se falam há mais de 20 anos... enfim - tudo contribuía para que estas maravilhosas canções caíssem para sempre no breu do esquecimento. E ela as gravou lindamente, com arranjos deslumbrantes e interpretação perfeita, como costuma fazer. Pois bem, a entrevista saiu com a chamada 'A MPB Está Pobre', frase em que Mônica contextualiza o que a indústria oferece hoje ao público do Brasil; e a crítica, com o título 'a melhor cantora em seu CD mais refinado', ou algo assim. Pronto: o mundo caiu. Todas as cantoras que não suportam ver outra ser chamada de 'a melhor' se manifestaram contra. Todos os compositores que não foram citados na matéria (nem teriam porque sê-lo) caíram em cima da pobre Mônica, dizendo que ela só grava o estabelecido, ou que a MPB morreu e não sabe, ou ainda sua variante, a MPB é riquíssima e ela, Mônica, e os jornalistas que a entrevistaram não sabem disso, desconhecem os "gênios ocultos" que só se encontram na internet. E por aí vai.

Como não é assim que a arte funciona, eu e outros amigos fomos em defesa deste trabalho lindíssimo e fundamental. O que faz a magia da arte é… a magia da arte, certo? É aquele não sei quê que faz a confusão. Já dizia Luiz Melodia: quem tem, tem; quem não tem, não se conforma. Ah, as polêmicas. Detesto todas. Eu quero é sossego. Se o FB se transformar, ao invés de um lugar onde se troca idéias e se encontra amigos, neste espaço de raiva e rancor, estarei fora em breve. 

Isso tem se dado em todos os níveis. Tenho lido desavisados(as) dizendo horrores impensáveis para e sobre os judeus, como se todos os judeus do mundo, Brasil inclusive, fossem israelenses de extrema-direita e apoiassem as ações do governo de Israel contra os palestinos. Outra hora são os apoiadores do atual governo brasileiro, culpando a oposição até pelos 7x1 que tomamos da Alemanha nesta Copa. Ou seus opositores exagerando também na dose. É o inverno do pensamento, o que estamos vivendo, numa era em que nunca houve tanta informação disponível para todos. É a revolta da mediocridade contra a inteligência. 

Temo pelo futuro.

12 Comments:

At 8:12 PM, Anonymous Mauricio said...

Joyce, Menescal, Monica Salmazo, P.C Pinheiro e tantos outros. Obrigado por me livrarem desse frio tenebroso. O barquinho vai....

 
At 1:17 PM, Anonymous Osmar said...

Não sei se concordo com isso. Ela é a melhor cantora na opinião do jornalista e ao taxa a maioria de "pobre" , quer dizer que o que ela faz é que é bom. Menos né? Ou ela ou jornalista ofendeu uma classe inteira e ainda que ser "poser" é ter razão. Sei não, desejo sorte e sucesso ao trabalho dela, mas pra mim, limitar o bom à Guinga e a PCP é só um truque de marketing.

 
At 10:36 AM, Blogger Luiz Antonio said...

por coincidência, só entrei no FB por sua causa! (aí, aí, aí...Joyce!)
risos...explico:
Para o CD TUDO disseste que haveria interação pela internet com Facebook ou outras atividades que seriam definidas... Me habilitei incluindo meu perfil. Não teve votação por FB, acabamos dizendo aqui no blog que votávamos em TUDO e os que tiveram a sorte de poder ir aos shows votaram na urna.
Então ficou ali o perfil inativo. Acabei achando outra finalidade: usei como uma forma de conhecer melhor alguns que cruzam meu caminho na minha jornada de trabalho: alguém com quem me relaciono profissionalmente e que por alguma afinidade vimos a chance de estender esse vinculo de trabalho para uma amizade virtual e _quem sabe_ Real, um dia.
Então no meu face não add amigos de verdade (reais) e nem parentes. Mantive ele "secreto" para justamente não ter que me defrontar com coisas que não são legais tipo: rancores, brigas e cutucadas encima de fofocas de parentes, amigos e coisas que derivam para esses sentimentos negativos que listaste. Além do que acho um nível de exposição absurdo e invasivo (sem falar no lado cômico, pois tem gente que só falta chegar ao ponto de levantar-se da privada e, antes de dar descarga, sacar uma foto com celular e "postar" a "postada"!)fora as "postadas" mentais que circulam nele também!
É uma coisa estranha mesmo esse FB !

 
At 11:59 AM, Blogger joyce said...

Caro Osmar, você leu a matéria? Ela deixa bem claro que está se referindo à indústria, ao que é servido compulsoriamente ao público brasileiro, coisas que passam por MPB para o grande público - sertanejo pop, gospel, funk, essas coisas. Achei isso muito claro, e nunca imaginei que tantos se ofendessem com tal declaração, que me pareceu bastante clara. Enfim, cada um lê do jeito que quer.
E Luiz Antonio, teve votação no fb sim. Você não achou a página?

 
At 1:20 PM, Blogger Luiz Antonio said...

Bah, Guria! Pior ! Curti uma página Joyce Moreno, quando criei o perfil,mas vai ver não era oficial porque foi somente há pouco tempo que acessei uma "Joyce Moreno" e veio página diferente, com fotos do CD e atualizações de sua agenda, daí troquei a minha "curtida" pra essa e , desde então, recebo atualizações. Perdi a eleição! Bom, então aqui justifiquei minha ausência (hahahaha)

Quanto a Monica, coitada! Quem sabe do trabalho dela e da música brasileira criativa nem precisa ler o artigo para entender que pobreza é essa que ela se refere.

Vou atrás de ler, mas com certeza cada um lê o que quer!

 
At 11:54 PM, Blogger Cyntia Monteiro said...

Toda semana eu tenho vontade de sair do facebook... Daí eu lembro das coisas boas que encontro por lá. São poucas, mas existem. No mês passado decidi ficar só com as coisas boas. Deletei sem pena todo mundo que escrevia qualquer besteira, extremistas, alienados, colegas de universidade que nunca falaram comigo e me adicionaram nem sei o porquê. E agora estou me sentindo ótima. (dica útil pra vida online: se você não quer fazer isso, entre na página da pessoa e deixe de "seguir" as publicações. Continuará seu "amigo", mas não verá o que escreve na sua página inicial. Uma maravilha.)

Sobre a matéria d'O Globo, li junto com um amigo e na mesma hora pensamos: vai dar treta! Só não imaginava que seria desse tamanho que você está contando. Quanta gente desunida. Não vi nada demais no que ela falou... Outro dia li em algum lugar: "Falta amor no mundo. Mas também falta interpretação de texto". É bem por aí, mas fiquei também com a impressão de que não foi publicada exatamente como ela falou, além da chamada bem sacana que aparecia gritando em qualquer compartilhamento do link da matéria. Polêmica à parte, acho que o disco deve estar incrível. Na minha humilde opinião de quem não entende muito de música, Mônica é muito dedicada ao conteúdo e qualidade do que produz e lembro que desde que escutei sobre ela a primeira vez, sempre a vi falando de Guinga com muita admiração... Não conhece o repertório de ontem.

(Falo demais. Logo, escrevo demais. Desculpa o comentário grande!)

 
At 12:29 AM, Blogger Luiz Antonio said...

DICA:
Cegueira moral
A perda da sensibilidade na modernidade líquida
Zygmunt Bauman

O trecho que fala sobre internet e FB tem muito haver com o que escreveste, inclusive se referindo em termos semelhantes: as soMbras, o inverno o lado obscuro dos pensamentos que são colocados ali.

 
At 1:12 PM, Anonymous Osmar said...

Oi Joyce, eu tratei de reler a matéria para me posicionar melhor.
Acho que há uma sucessão de erros e ânimos que se alteram facilmente.
- O Título infeliz é o principal motivo da caçada à Monica por conta da declaração. Se claramente ela se refere à música industrializado, à industria do entretenimento, o jornalista jamais poderia dizer que ela está criticando a MPB.
O duro é que o jornalista, assim como a Monica, goza de muito prestigio e não se vê histórico de polemismo.
Eu vim deixar meu parecer porque tanto os que defenderam a Monica, quanto os que criticaram, me pareceram meio exaltados.
Acho que não precisa haver caça às bruxas, não são cantoras ciumentas criticando, mas todos meio à flor da pele, porque a industria tomou o lugar do que poderia ser música, e a música bem trabalhada ficou à ver navios.
Beijo, obrigado pelo cuidado de publica e responder uma opinião, ainda que contrária à sua.
O debate no Facebook foi muito bom.

 
At 2:29 PM, Blogger joyce said...

Bom, vamos lá: quem conhece a mecânica de uma redação de jornal - eu sei, pois já trabalhei numa - sabe que os títulos das matérias são decididos pela editoria do caderno. Portanto, nem o repórter tem necessariamente a ver com isso. E olha, cantoras ciumentas, já vi muitas... :-) às vezes essa competitividade faz parte da natureza da profissão, e é por isso que não me sinto cantora.
Finalmente, mas não menos importante, optei por desativar minha conta, sem ter de bloquear ninguém. Perde-se um tempo enorme com as redes sociais, e a sensação de tempo perdido aumenta quando se cai no meio de uma polêmica estéril como essa, que não leva a nada, só fomenta rancores. E vamos mudar de assunto?

 
At 10:19 AM, Blogger Ana Silva said...

Sai do fb quando notei que estava ficando com raiva também... E parecia haver uma competição estranha de quem tem mais ódio, mais selfies, mais babaquices no final. Acho que me retirei, pra não entrar na disputa do mais besta.


Joyce, vou fazer uma pergunta que pode parecer um pouco nonsense neste contexto, acontece que antes de achar o seu blog eu estava pesquisando exatamente isso, mas, lá vai a pergunta... Do que se trata a música Vivo ou Morto?


 
At 3:42 PM, Blogger joyce said...

Oi Ana, essa canção de Danilo Caymmi e João Carlos Pádua é dos anos 1970, tempo de ditadura pesada no Brasil. Tínhamos muitos amigos na clandestinidade ou desaparecidos. É sobre isso que a música fala, metaforicamente.

 
At 4:48 AM, Blogger pituco said...

joyce,

e la nave vá…

abrsonoros

 

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